terça-feira, 14 de junho de 2011

Quase perfeito.

Em sua vida tão segura,
em sua casa tão ordeira,
em seu mundo quase perfeito,
eu ainda nao consegui ficar.
Entrei por um descuido dela,
Por uma falha na segurança
e lá fiquei por um tempo.
Tempo de calmaria, de deleite.
Tempo de beijos longos e suaves.
Tão generosa, rodeada de amigos
que a amam como irmã.
Inabalável, inespugnável muralha de amor.
De sardas, de pequenos seios brancos.
Alma inquieta, têmpera de aço.
Tanta força escondida
Em seu pequeno corpo de mulher.
Não fui capaz de toma-la
De roubar-lhe as armas.
Nem tão pouco ser arrestado,
por sua nobreza, por seu vigor.
Quero voltar, mas perdi o caminho.
Não sei mais como roubar-lhe um beijo,
como confiscar-lhe o afeto,
como fazer da dor comunhão.
Espero, meu verdugo sempre paciente,
o Senhor tempo.
Quem sabe ele me redima
e eu possa de novo ver-lhe a brancura,
ouvir-lhe a risada, sentir-lhe o cheiro,
saber de seu doce amaro do cerrado
e andar de novo de mãos dadas,
em seu mundo quase perfeito.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Passageiros.

Me disseram que ele é feio
E que, portanto, é feio ser feio.
É feio contrariar a beleza.
Tanta beleza posta sobre uma poltrona marrom,
confortável e segura em seu barquinho.
Ela não teme, não implora, não se sente ameaçada.
Ele me perscruta serenamente, de seu pináculo.
Posso ver sob a luz, pequenos vasos azuis
sob a pele branca, ainda imaculada pelo tempo.
A brancura das mãos, faz-me saber dos pés
sempre escondidos, sempre seguros do caminho.
Do lado de cá dos abismos, peço-lhe que me salve,
que construa uma ponte, mas ela sabe da acrofobia.
Quisera ser resgatado, por suas mãos brancas.
Ser içado do Sheol, lavado e quarado em ribeirões.
Anestesiado por eflúvios de alegria infantil,
viver o resto que resta, sem pressa, sem susto.
Mas ela é apenas um passageiro como eu,
Que questiona a feiúra do feio.
Ela quer ver a beleza, e talvez até consiga.
Ela quer me mostrar que há um jardim secreto,
Onde uma fonte se insinua por entre flores amarelas.
Quer me mostrar que borboletas flanam sob a água,
satisfeitas e impolutas, com pressa de sorver a vida breve.
Ela própria esta agarrada ao jardim,
por um cordão umbilical indissolúvel.
Mas seu jardim tem ordem como em Monet,
Sou Basquiat, sou Dali, sou névoa e chumbo.
Tenho o peso de mil eras.
Sou como um hidrante seco numa rua deserta.
Preciso tomar um copo de esperança,
Sorve-lo devagar e deixar molhar o peito
como quando era menino.
Quando as coisas eram elas mesmas
e eu não podia, nem sabia explicá-las.
Quando o medo vinha deitar-se comigo
e fugia apavorado com o sol.
Nesse tempo, eu existia irresponsávelmente
e cada dia era uma aventura e eu podia aprender.
Parece que agora eu já sei tudo...