segunda-feira, 31 de maio de 2010

CICLO

Segue a turba
Alheia e determinada,
Vão ao encontro do fim.
Uns vão rápidos
Outros letárgicos
Segue dentro, a dor.
Aguda, profunda, desapercebida
Dor.
N’alguns, réstias de alegrias
Ate que lhes saia o ocaso.
Em seus veículos variados,
Se movem como insetos.
Seguem incertos.
Uns param pra gritar,
Avisam de um eminente fim
Mas ninguém sabe ao certo.
É “Matrix”,
Só não há como fugir.
P.S
Lá vem o sol de novo...

terça-feira, 18 de maio de 2010

Deus. (Jô 38.4)

Deus o que vê.
feiura nossa
beleza vã?
O que vê?
Lascívia, bondade
Altivez, cãs?
Vê o que é
Ou virá a Ser...
Deus vê
O que crê e o que não.
Vê a mim lá dentro
Onde eu mesmo temo saber
Os porões mais escusos
De todo Ser.
Deus da luz
Das trevas mais densas
Vê!
Quando durmo você
Dentro em mim
Nas torturas de ser.
Deus vê.
O que ocultamos
O que não pensamos
Ele lê.
Mesmo sem existir
Ele nos vê.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Politereftalato de etileno

É rasa a minha alma
É baixa, inaudível
Efêmera como o capim.
Mas ela se quer durável
Como o plástico.
Circunstante e volúvel
Está presa em teias
Que ela mesma teceu
Não as teceu para si
Mas na teia se achou.
Se perdeu, se esqueceu.
Todo torpor ela quer
Nada de sol, de clareza
Nenhuma certeza.
Ela miseravelmente
Se apegou a lugares,
Nomes, pessoas, memórias.
Coisas que se inventou.
Ela mesma pensa e aquiesce.
Ela nunca se acaba.
Escreve para si mesma
Endereça cartas à sua casa.
Longas cartas sem letras.
Vou pedir-lhe novamente
Educadamente vou
-Minha alma, me deixe.
Vá embora, por favor!

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Sobre o profundo. (Jeremias 17.9)

É profunda a dor
Como é o sofrimento
De tão fundo o siso
Que é tísico o clamor.

Vem em ebulições
Que volúpia não tem
Nem magma, nem lava
É seco como o gelo profundo.

É estático, sem cor
Todo pedra, todo vapor
De um lugar que não sei
Ele vem, informe, inodoro.

Não fede e não cheira
Não tem sequer bolor
Mas existe e é tátil
Sem forma nem teor.

Rarefeito e insalubre
Ele está dentro, estanque.
Inominável, imensurável.
É profundo, é dor.

E ele se apega a carne
Se agarra como escama
Com seu cheiro podre
Seu caminho, aluvião.

Das profundas águas
Insondáveis do coração
Quem o conhecerá?
Quem medirá seu poço...

Uma cana de medir
Um juiz angular
Um menino
Um sopro o argüirá.

O TODO E AS PARTES. (Eu sou. Êxodo 3.14)

O silêncio não existe

o silêncio é Deus

só ele existe

e nada do que é, Existe de fato.

O mundo inexiste

a rocha não é

o homem nem sabe.

Porque o homem finda destarte

e o que ele era, não é mais.

A morte não existe, porque é finda.

Nem vida, nem parte.

Coisa alguma existe

tudo se parte, a louça, o corpo.

Só a palavra existe e é finda.

Existe para o ouvido e língua.

Se é findo o ouvido, é morta a madre.

O capim crepitando ao sol

nem sabe sua inexistência fútil

tão essencial aos que dele vivem e não sabem.

Só existe de fato o verbo

ele é amoral, é mater.

Ele se fez, ele mesmo se basta

é o caos, é desastre

é ordem, é rima, é ritmo.

O verbo é arte

é substância e espírito

o verbo é parte

é o todo

é nada.

A casa

Há! Se eu pudesse pintá-la
Dar-lhe uma massa corrida
lavar-lhe, abrir-lhe as janelas
Dessa casa, escancará-la..

Tiraria as velhas teias
Por-lhe-ia nova fachada
Fecharia as brechas
Estancaria nela as águas.

Essa casa minha não é
Nem casa de fato
Casa torta, caiada
Casa que se fez sozinha

Casa sem construtores
Casa deformada pelo tempo
Casa rota, velha, empoeirada
Rotunda casa quebrada.

Se pudesse repintava
Dava-lhe novos ares
Mobiliava, encerava
Abria a porta da sala.

Iluminaria os porões
Da casa mal assombrada
Exorcizava, varria, limpava.
Aquela que chamo de casa.

Naquela rua deserta
Onde habitava a casa
Plantava uma árvore
Punha uma cerca baixa.

Novas caras na casa
Iam animá-la, decorá-la
Adornos de nomes e vozes
Pendurava na sacada.

Varandas francas e claras
Abertas só para os de casa
Os amigos, os filhos
Gerados naquela cama.

Portas, batentes e pisos
Punha novos na casa
Para adornar sua cara
Sem rima, sem metrificá-la.

Aquela que chamo de mundo
Aquela que chamo de casa
Que esta dentro e em cima
A casa que é minha alma.

O monstro

O monstro está lá
ele é feito de nadas
de coisas que não são.
Monstro triste
tem um olho só
uma orelha só
uma boca só
monstro mesmo
monstro de dentro do profundo.
Esse monstro quer ser eu
eu sou ele, dentro dele.
Monstro execrável, iracundo.
Monstro frágil e amedrontado.
Tem medo de espantos, de escuros.
Monstro trevoso e desarmado.
Ele está lá, quer sair, mas teme.
Esse monstro meu, Quasímodo,
mudo, metafísico, malogro.
Ogro de dentros, de escombros.
De versos, de letras tortas.
Monstro de antanhos e de porvir.
Exume-se o monstro em mim.