sábado, 26 de março de 2016

Quintal

Há quem eleja palavras por qualidade,
dando a umas serventia de restolho;
Divirjo: o rebotalho me tem em valia valiosa.
Me formei em garimpeiro de monturos,
de estradinhas bordeadas de capim seco,
onde o vim-vim esconde os ovos pintadinhos.
Cantador de coisas ínfimas, me atinei para chãos,
para o rebuliço do vento na restinga do banhado.
Me alteram o cheiro da areia depois da chuva rala,
o chilreio do Maria-ferrugem aninhando.
Me entorpeci no cerrado por suas tardes,
onde um pau seco grita seu oco queimado.
Emudeci com o corre-corre do tambiú no reguinho,
que de tão silente amarelou uma tarde outonal.
Um aluvião abriga sonhos de pedregulhos andarilhos,
cheios de antigas historias de areia e gravetos,
viajantes de paragens onde não há rastro de gente.
Destas miudezas mínimas me tornei vassalo,
coisas inomináveis, coisas de nobre inutilidade.
O que não existe invento, o que não invento calo,
porque quando évem, em silencio barulhoso,
desses que faz a seriema assuntar a quietude,
me faz bordejar numa lembrança matagal,
de um tempo em que eu meninava uma nuvem.
Naquele tempo, diante da serra infantil
que nasceu no quintal de minha avó,
foi que aprendi a desvalia, o inútil,
o cheiro de palavras emboloradas,
o valor do desvario quando embeleza,
que ela guardava num saquitel amarelento,
com lições de vida e morte.
Senhora das estações, tinha tenências para ventos
e sabia de cor outonos e agostos.




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