segunda-feira, 19 de junho de 2017

Fastio

Viver sempre na superfície,
nos valados, no rasteiro, no grotão.
O raso é sempre seguro, não intima,
onde o mormaço oscila uma poça
e uma poeirinha besta açoita.
Sou do raso, da superfície,
rejeito profundidades e inquérito.
Quero sempre o inútil do cerrado,
a fome do lobinho, o mormaço,
o sol que finda amarelando o dia
para a noite já se inaugurando.
As demandas dos homens cansam,
sempre a mesma ladainha, o mesmo choro,
a mesma reza inútil, a mesma fome.
Tudo é solene, tudo é sagrado:
A morte, o nascimento, os laços,
a dor, a alegria, tudo é pesado...
Clérigos roçam baixo, o pasto
com sua nobreza régia, sua voz calma,
seus arreios levam seixos santos,
ossos, panos,lágrimas, lâminas etéreas.
Mas o grotão tem seu próprio lume,
sua prece sinuosa, sua volúpia,
seu burburinho aquoso, seu nume.
O carcará pinçou um pintainho
e subiu seu voo legítimo.
Uma rabeca lambeu um ingazeiro,
seco, seu dorso branqueia a casca.
O inverno no cerrado é amarelo
no capim que cresta derriçoso.
Querelas estão nas copas por pouso,
não há necessidade de ordem.
Ao fim do sol, a noite negrurou
e as manhas virão eternamente.
-Percisa não seu moço!
O que évem sempre já estava!

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