quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Metamorfose

Sempre tive essa parecência de árvore,
mas nunca pensei que minha natureza madeiral
ia brotar para além das ideias,
para mais que alguns ramos toscos.
Os pêlos do meu corpo estão para raizes,
estão me enterrando feito mata-pau.
Estou enrijecendo ruidosamente o tronco.
Folículos vegetais me enredam em por dentro.
Como uma criatura de Lobato, mítico.
Já tenho esperanças de cardos
já tenho vivências de embaúbas sequiosas.
Formígas moram em meus membros
e não posso mais expurga-las.
Tenho seivas, casca e nódulos
que se espalham nos costados.
Pessoas me olham como se embrutecesse
por pender feito a figueira-vermelha.
Não posso dizer-lhes, minha glote é oca.
Tenho voz de cedro roxo quando balança.
Depois de encopado, depois de retorcido
Vou ser útil, como pessoa não fui.
Tenho competência pra barco, pra berimbáu.
Talvez meninos subam-me à copa
e balancem, contem doidices de meninos
sem saber que os ouço com minha memória de homem velho,
de homem pau, de coisa.
Singrar rios, soar cantigas de roda
são minhas ambições de mato.
Já fui pote, tapera, igarapé.
Agora sou cipó.
Quero empessoar um cocho d'água
dar de beber a Burros e Bem-te-vis.
Sim senhor, bichos maiúsculos como queria seu Lobato.
Quero empuleirar Biguás e Urutaus
e terminar oco e corrompido
dentro de um rio a me atravessar as frestas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário