sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Um menino.

Me disseram por entre linhas
que tenho tendências para o torto.
Acrescento feliz que ao avesso também,
tenho prazer em síncopes, em incompletudes.
Quero ardentemente desarranjar o mundo,
descompor a compostura dos gestos, dos acordos.
Tenho poucas palavras úteis embaixo da língua,
as tenho como espinhos sob o travesseiro.
Tenho saudades de brejos e caminhos tortos.
Minha memória sofre sapos em noites de chuva,
entorpecem-me como Rachmaninoff.
Há! Que alegria, que regozijo há no torpor,
que lucidez nos olhos do menino chupando manga.
Já fui pleno, já estive completo.
Mas fui aprendendo e envilecendo,
fui descobrindo e esquecendo
o gosto das coisas chãs.
O modo gracioso da vespa entrar na terra,
o cheiro saboroso da cana quando queima,
os beijus que minha avô pendurava na janela
e fingia não nos ver roubar.
Fui me perdendo daquele menino
do canto da torre que anunciava Deus entre os homens.
Tenho as mãos cheias de nadas
e trago na mala um mapa de escombros.
Talvez ele esteja lá, o menino.
Espero ser capaz de entender sua língua de menino.

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